domingo, 20 de julho de 2008

Prólogo


O que há? O que há além da janela? O que há além dos olhos dela? Essa pessoa mais ou menos feliz que você vê todos os dias mimetizada às esquinas cinzas do centro. O que há? O que há além desse vazio no peito, esse coração amiudado que parece viver numa fina agonia que não passa, mas que não destrói completamente. Esse esgar mudo que, como uma dor de dente, acompanha seus passos, sua rotina.
O que há além da janela? Esses imensos olhos de vidro frágil nos quais ela olha a vida lá embaixo passando incólume pela sua existência. Esse espelho frio levemente embaçado pela fria madrugada que a violenta.
O que há além dos olhos dela? Esses olhos que as pessoas não enxergam, embora vejam todos os dias atrás do balcão, na sala de aula ou passeando perto do CCBB. Na verdade nem era pra doer. Ela também já não enxerga as pessoas. Estuda a história de genocídios sem perceber que ela mesma não passa de uma anônima que bem podia existir como não existir. Exatamente. Ela não percebe que apenas existe. Está longe de viver quando o silencia se impõe, a lua anda no céu e ela rabisca mais uma folha de seu velho diário.

1 Comment:

Hudson Pereira said...

Você tem muito orgulho deste texto não é?
E com toda razão, eu acho incrível como vc consegue ser sensível e frágil com as palavras,e na vida se mostra tão inabalável.
No passado eu queria muito ter conseguido transpor as barreiras, hoje fico satisfeito em ver que não te conheci de verdade,e ainda me surpreender com que vc mostra.